segunda-feira, 7 de junho de 2010

As férias, o mendigo e o vizinho dele

O Presidente da República pediu aos portugueses para passarem férias cá dentro e não no estrangeiro:
"Aqueles que podem passar férias, devem fazê-lo cá dentro para ajudar Portugal a vencer as dificuldades atuais, pois passar férias cá, é criar emprego, combater o desemprego e ajudar à melhoria das condições de vida dos portugueses (...) Ajudar é reduzir o sofrimento daqueles que não conseguem entrar no mercado de trabalho ou que perderam o seu posto de emprego e encontram dificuldade em recuperar um outro... (...) passar férias cá dentro, nesta altura difícil, é também uma atitude patriótica."

O ministro da Economia Vieira da Silva respondeu em Xangai desejando que os preisdentes dos outros países não fizessem o mesmo tipo de apelo:
“Só espero que outros chefes de Estado de outros países não façam o mesmo apelo senão perderemos um fonte importante de divisas em Portugal”

O Presidente da República voltou hoje a reafirmar o que disse afirmando:
"(...)férias passadas no estrangeiro são importações e aumentam a dívida externa portuguesa(...)


O que leva um Presidente da República que é economista a usar uma política que é condenada por tudo quanto estudou sobre economia?
Crescer "comendo" crecsimento aos outros é em economia conhecido como políticas de "beggar thy neighbour". E Vieira da Silva ilustrou bem os seus efeitos perniciosos - se os cidadãos de todos os países fizerem o que Cavaco Silva disse aos portugueses para fazerem, além de todos crescerem menos, países que dependem mais do turismo serão aind amais castigados que os outros.

As políticas de crescimento por "comer à conta do vizinho" têm como resultado todos ficarem pior e deram muito maus resultados nas anteriores recessões - alguns economistas consideram que a crise de 1929 poderia ter sido menos grave se não se tivessem aplicado políticas proteccionistas.
Vale a pena ler The protectionist temptation: Lessons from the Great Depression for today

Na actual crise vários países na Europa e na América do Norte têm, mais ou menos discretamente, usado a arma do proteccionismo.
Já assistimos ao "Buy American" e "British jobs for British workers" comentado criticamente por Buiter
Ainda recentemente os franceses avançaram com uma campanha "compre francês" e é possível encontrar na versão em inglês do Der Spiegel argumentos a favor do proteccionismo (não encontrei o link).

Cavaco Silva como Vieira da Silva sabem bem tudo isso. O que leva então o Presidente a fazer um apelo tão perigoso? O facto de sermos um pequeno país? Um grande mendigo viver à custa do vizinho não tem o mesmo efeito que um pequeno mendigo viver à custa do vizinho? (Para não falar das violações do Mercado ùnico, mas quem não as pratica que atire a primeira pedra)

Há outros argumentos a favor. Como os de Paul Krugman e João Rodrigues. Assim como o apoio que em geral a opinião pública dá ao proteccionismo, como se vê neste barómetro passado do Negócios - embora possa praticar pouco.

2 comentários:

A Telles disse...

Faltaria só acrescentar que, para apoiar o seu apelo, o Professor Cavaco Silva lançou uma falsa informação, ao dizer que Portugal é o país da Europa (ou UE, tanto faz) com maior dívida externa bruta em percentagem do PIB, quando na realidade é o 5º da UE e o 6º da Europa. No actual contexto de gestão do risco ao minuto, apetece mesmo tirar umas férias lá fora... e bem prolongadas.

Défice comercial aumenta disse...

"All is fair in trade and war."

Mercantilismo é uma realidade e ainda bem que um dirigente politico finalmente deixa de lado a ingenuidade académica portuguesa, que eu não encontrei nas universidades americanas.

Já pensaram quando do nosso Natal consiste de "artigos importados", começando pelo bacalhau da Noruega?

PPP Lusofonia